the sound of silence

Hello darkness, my old friend
I’ve come to talk with you again
Because a vision softly creeping
Left its seeds while I was sleeping
And the vision that was planted in my brain
Still remains
Within the sound of silence

In restless dreams I walked alone
Narrow streets of cobblestone
‘Neath the halo of a street lamp
I turned my collar to the cold and damp
When my eyes were stabbed by the flash of a neon light
That split the night
And touched the sound of silence

And in the naked light I saw
Ten thousand people maybe more
People talking without speaking
People hearing without listening
People writing songs that voices never shared
No one dared
Disturb the sound of silence

“Fools,” said I, “you do not know
Silence like a cancer grows
Hear my words that I might teach you
Take my arms that I might reach you”
But my words like silent raindrops fell
And echoed in the wells of silence

And the people bowed and prayed
To the neon god they made
And the sign flashed out its warning
In the words that it was forming
And the sign said “The words of the prophets are written on the subway walls
And tenement halls
And whispered in the sound of silence

O grito

Não valia a pena esperar, ninguém viria
que nos segurasse a cabeça e nos pegasse nas mãos,
estávamos sós e essa solidão éramos nós;

e era indiferente sabê-lo ou não,
ou gritar (ou acreditar), porque ninguém ouvia:
o grito era a própria indiferença.

Presente, apenas presente;
a memória, presente,
a esperança, presente.

E, no entanto, houvera um tempo
em que tínhamos sido talvez felizes,
quando não nos dizia respeito a felicidade,

e em que tínhamos estado perto
de alguma coisa maior que nós
ou do nosso exacto tamanho.

Como um animal devorando-se
por dentro a si mesmo,
consumira-se, porém,

o pouco que nos pertencera, os dias e as noites,
a certeza e o deslumbramento, a cerejeira e a
palavra “cerejeira” ainda em carne na jovem boca.

Nenhuma beleza e nenhuma verdade que nos salvasse,
nenhuma renúncia que nos prendesse
ou nos libertasse, nenhuma compaixão que

nos devolvesse o ser
ou o mesmo,
ou fosse a morada de algo inumano como um coração.

Nenhuns passos ecoavam no grande quarto interior,
nenhumas pálpebras se abriam,
como poderíamos não nos ter perdido?

Entre 10 elevado a mais infinito
e 10 elevado a menos infinito,
uma indistinta presença impalpável na indiferença azul,

sós,
sem ninguém à escuta,
nem a nossa própria voz.

Manuel António Pina, Os Livros, Assírio & Alvim.

resgatado daqui.

isto é o meu corpo

O corpo tem degraus, todos eles inclinados
milhares de lembranças do que lhe aconteceu
tem filiação, geometria
um desabamento que começa do avesso
e formas que ninguém ouve

O corpo nunca é o mesmo
ainda quando se repete:
de onde vem este braço que toca no outro,
de onde vêm estas pernas entrelaçadas
como alcanço este pé que coloco adiante?

Não aprendo com o corpo a levantar-me,
aprendo a cair e a perguntar.

José Tolentino Mendonça, Estação Central, Assírio & Alvim, 2012

já então a raposa era o caçador

“Não é a língua que é a pátria, mas sim aquilo que dizemos”, escreveu Jorge Semprúm em A Escrita ou a Vida (ASA,1995). Todas as ditaturas põem as línguas ao seu serviço, é sabido. E para os exilados essa língua acaba, por vezes, por se tornar hostil, o que parece não ter sido o caso de Herta Müller. ” A pátria é o lugar a que se pertence, não é o lugar em que se nasce. Mas às vezes sinto que a Roménia é a minha pátria: chega-me uma certa nostalgia em lugares quentes porque me faz lembrar o Verão romeno. Ou quando vejo certas árvores, o marmeleiro. Isso acontence-me muito na Bulgária, ou em Barcelona…onde num dia quente, quando chove, lembra-me a Roménia.”

Müller afina o critério de qualidade de um texto pela capacidade deste provocar o diálogo com o leitor “de outra forma que não palavras”. Isto, segundo ela, é tão válido para a poesia como para a prosa, pois o texto literário tem que tocar mais coisas do que aquelas que ele próprio nomeia e descreve : fazer uma espécie de “desautomatização” da linguagem e de inovação metafórica.

Herta Müller, no último Ípsilon, por José Riço Direitinho.

o horror

Em “o horror económico” de viviane forrester , a romancista e ensaísta coloca em epígrafe pensamentos de pascal e iluminações de rimbaud.

Certa noite, por exemplo-, retirado dos nossos horrores económicos – ele estremece à passagem das caçadas e das hordas. Rimbaud

Não convém que [o povo] sinta a verdade da usurpação : introduzida outrora sem razão, tornou-se razoável; convém que seja encarada como autêntica e eterna, ocultando-se-lhe a origem, se não quisermos que ela termine a curto prazo. Pascal